Rede social pode prejudicar saúde mental, relacionando-se com ansiedade, depressão e imagem corporal, de acordo com estudo da Royal Society for Public Health
“A grama do vizinho é sempre mais verde”, diziam nossos avós lá atrás. O hábito de comparar a nossa rotina com a dos outros não nasceu agora. Mas, com o crescimento das redes sociais, se tornou ainda mais fácil passar horas a fio acompanhando realidades que, muitas vezes, são muito difíceis de se alcançar. De acordo com pesquisa da Deloitte, empresa que fornece serviços variados com a colaboração de firmas independentes, o brasileiro desbloqueia o celular, em média, 78 vezes ao dia. Quando se trata de jovens entre 18 e 24 anos, o número sobe para uma média de 101. Não precisa correr para o shopping. Na tela de um smartphone temos diversas vitrines nos apresentando o que é viver bem e ser feliz . E, vivendo longe disso, estamos cada vez mais tristes.
Não se assuste. A tristeza que alguns sentem com essa comparação excessiva no mundo digital tem um porquê. Segundo pesquisa da Universidade de Leeds, no Reino Unido, pessoas que passam muito tempo na internet têm maior risco de apresentar sintomas depressivos. Já de acordo com a instituição de saúde pública do Reino Unido, Royal Society for Public Health, em parceria com o Movimento de Saúde Jovem, as redes sociais são mais viciantes do que álcool e cigarro. É por isso que você passa tanto tempo por lá.
O doutor e mestre em psicologia pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Fauzi Mansur, afirma que as redes sociais geram um descompromisso total com a realidade e que esse descompromisso muitas vezes se apresenta como um processo de alienação, que, para a psicologia, significa se perder na importância do outro. Tiramos fotos esperando por elogios, mostramos imagens de nossa viagens esperando surpresas e curtidas. Assim, passamos a construir uma dependência em relação ao olhar daquele que está nos acompanhando.
“Além disso, nós recebemos informação demais. O nosso psiquismo tem que processar porque ele faz isso mecanicamente, mesmo sendo bom ou ruim. Então fica tudo extremamente superficial, não conseguimos julgar o que é certo ou é errado e ficamos em uma confusão muito grande, gerando uma série de patologias: ansiedade em excesso, angústia em excesso e impotência, porque a gente não consegue lidar com todos os problemas que são apresentados”, relata Fauzi.
Para essa matéria, criamos um questionário eletrônico simples, apenas nove perguntas, com 13 participantes entre 16 e 25 anos. 84,6% do público que o respondeu apontou que o Instagram é a rede social que mais utiliza. Até aí tudo bem. Mas, de acordo com o mesmo estudo realizado pela Royal Society for Public Health, essa rede social foi avaliada como a mais prejudicial à mente dos jovens, relacionando-se com ansiedade, depressão, solidão e imagem corporal. Isso explica outro dado levantado em nossa enquete: 53,8% dos participantes afirmam realizar comparações entre a sua vida pessoal e a de quem acompanha na internet. Questionamos, também, o que eles tinham vontade de mudar em si mesmo enquanto estavam nas redes sociais. Respostas como “corpo, vida profissional, personalidade e inseguranças” foram recorrentes.
Assim, os padrões de beleza tão enraizados na sociedade alcançaram um novo patamar, o “padrão de vida”. Com a criação de profissões como a dos influenciadores digitais, que exibem viagens luxuosas, restaurantes caros, roupas de marca e sorrisos de orelha a orelha, viver uma rotina comum enquanto acompanha esse reality disfarçado de vida real é motivo de dor. A linha entre o que é profissão e realidade é quase invisível.
“Já tive muitos problemas relacionados à autoestima por conta de redes sociais. Demorei muito tempo para trabalhar isso em mim. Hoje em dia isso é bem mais tranquilo, procuro comparações saudáveis. Sigo muitas mulheres ‘normais’ ou fora do padrão que se aceitam e isso me ajudou muito”, afirma a estudante de arquitetura Ana Luiza Balbino.
Apesar das mulheres serem mais propensas a ter depressão devido ao uso das redes sociais, como afirma pesquisa da University College London (UCL), os homens não saem ilesos enquanto navegam na internet. O estudante de ensino médio Fábio Ricardo conta que não se sente satisfeito com sua vida utilizando as redes sociais. “Sempre sinto um vazio independente de quantos seguidores tenho lá”.
O lado do criador de conteúdo
A influenciadora digital Crislayne Almeida busca reverter esse padrão de vida perfeita apresentado pelos colegas de profissão. Ela conta que, por também ter dificuldade em estar sempre com a autoestima elevada, entende a importância de ter pessoas reais mostrando que nem tudo é maravilhoso. “Desde que eu comecei a perceber que tinham pessoas sendo influenciadas por mim e a enorme responsabilidade que eu tinha com isso, [entendi que] eu teria que ser real, teria que ser eu mesma em todos os pontos. Se eu estou feliz com alguma coisa, eu vou mostrar isso. Mas, se eu estou passando por um momento difícil, também vou mostrar porque podem ter outras pessoas passando pela mesma situação e não têm com quem falar ou não têm alguém que entenda”.
A influenciadora digital Crislayne Almeida compartilha fotos com e sem edição em suas redes sociais
Ao compartilhar seus problemas e dificuldades, Cris conta que muitos dos seguidores se identificam e mandam mensagens contando suas próprias histórias, o que os aproxima e permite que ela ajude pessoalmente muitos deles.
Por trás de uma tela, de um sorriso grande ou de uma vida dos sonhos, existem pessoas que acordam de mau humor na segunda-feira, que choram após um término de relacionamento, sofrem com problemas familiares – talvez como você, que está lendo isso por aí. Não é porque não somos Kardashians, Jenners, Brad Pitt, Gisele Bündchen ou qualquer outro ideal que você possa pensar que somos menos. Precisamos aprender a entender os nossos defeitos e a aproveitar cada uma de nossas qualidades, para que elas sempre falem mais alto do que uma vida que a gente nem conhece de verdade. Acredite, o que está aí dentro é muito mais belo que qualquer paisagem por aí.
Por Ketlyn Victoria
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